O desejo que não pode se realizar.
- Rafaela de Joani

- 7 de jun. de 2024
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"Nunca tinha sentido aquilo, uma vontade de correr nas duas direções, a que junta e a que separa."
Tudo é rio - Carla Madeira
É comum pensarmos que a única causa do nosso sofrimento (geralmente o que leva a buscar tratamento) é a nossa impossibilidade de agir, de controlar ou de mudar a nossa realidade. Nos sentimos travados, paralisados frente aos sintomas e às demandas que acreditamos dever suprir, sem sucesso.
Então, o que podemos concluir, quando nos deparamos com um sujeito que se pergunta, diante da possibilidade de realizar algo do que deseja, se não seria melhor que nunca a realizasse? Quando diz que algo pelo qual tanto ansiava está prestes a se concretizar, mas preferia que não acontecesse? Quem poderia, em sã consciência, recusar o que quer ou sabotar o que gostaria que acontecesse?
Dizemos que só há desejo se houver falta. É pelo que nos falta que criamos numa relação com a fantasia a possibilidade de sua realização, ainda que parcial. Com isso, costumamos dizer que a fantasia é sempre melhor do que a realidade, justamente porque, além do fato de que o que não se concretiza jamais poderá acabar, o que se realiza, mesmo quando sustentamos o desejo, nunca é como fantasiamos que seria, sempre falta alguma coisa, sempre desemboca na incompletude, nos levando a desejar algo além, algo mais, algo diferente.
"Querer e desejar é manter-se vivo, e talvez seja mais importante do que realizar o desejo. (...) recuar diante dela (da realização) é preservar o irrealizado como fonte do desejo vivo."
Marco Antonio Jorge Coutinho
Assim, adiar tanto quanto possível a realização do que se deseja é, ao mesmo tempo, manter o desejo a salvo mantendo-se a salvo dele.
REFERÊNCIAS
Jorge, M. A. C. (2010). Fundamentos da psicanálise de Freud a Lacan – vol. 2: A clínica da fantasia Rio de Janeiro: Jorge Zahar.
MADEIRA, Carla. Tudo é Rio. São Paulo: Record, 2021.
